quinta-feira, 2 de março de 2017
TROCAS
Noite de Natal
Aquiliano reúne a família sob o alpendre da magnífica morada da fazenda, jovem e esbelta mucana faz os últimos arranjos para a ceia; nessas altura da noite já andam, Aquiliano e seus filhos, pela metade da segunda garrafa de uísque, e ele tinha um grave comunicado a fazer, trocara de amante, "larguei da lambisgoia oxigenada, aquela de quem tu não gostava, minha velha", "loira de instituto", contesta a mulher, "isso minha velha, arranjei coisa bem superior, daqui da pontinha", estala os dedos e prende o lóbulo da orelha entre polegar e indicador, "a vantagem dessa permuta está em eu agora poder dormir em casa, sem mais gastança, viagens, hotéis, táxi... funcionária pública, chefe de seteor, caixa alta, meio que deixada do marido...", os filhos berram "eba, eba!", trocam soquinhos de mão fechada sem, no entanto, perder uma vírgula do relato paterno, "boa pai", grita o caçula, propondo brinde à mana à direita que não fosse estar de porre teria erguido o copo e dito "tim", a sonolenta mãe, bobes espalhados sem critério pela cabeça, acuada pelo trio energúmeno de gêmeos sobreano e assimila os chutes nas costelas desferidos pelo diabinho em seu ventre, falou "tá bem, mas me dá licença marido...", "espera mulher, ouviste que esta não é loira? é morena natural, entonada..." "ouvi sim marido", oba, uau, falam todos em uníssono, inclusive a mulher, uauzinho, penoso bocejo, não consegue desvenciliar-se dos infernais trigêmeos, "tá bem, meu velho, eu já estava mesmo cansada de ouvir tu falar da loira, fez bem, marido, mas me dá licença tenho a impressão que bolsa vai rebentar...", "outro brinde ao nosso velho", propõem os herdeiros, uau,, que carão o nosso paaaaiiii!, o velho é bom companheiro, o velho é bom companheiro ninguém pode neegaááááá...", envaidecido, Aquiliano, nosso herói-bufão... fogem-lhe palavras... tão amorosa manifestação de apreço prostra-o; garante-lhes, porém... "jamais negligenciarei, meus filhos (a mana tombara sobre o velho e babava em sua coxa), minha filha... o espírito natalino é soberano em nosso lar... para o próximo Natal, se o ano correr bem, haverá uma substitura para essa morena. Uau!
(baseado em fatos mui reais)
quarta-feira, 1 de março de 2017
De Andarilho
Quem sabe bastasse
Que o jeito das coisas em volta
Mudasse
O nascente do sol
os quartos de lua
os meses do ano
as horas do dia...
a cor da cancela
o aroma das flores
da erva do mate
da lenha pra'o fogo
sabores do leite
quadrante dos ventos
a cor das paredes
a hora da prosa
do arroz com feijão
temperos da carne
o balde descendo e subindo no poço
o ar da cozinha de café recém passado
a hora da sesta
o toque dos sinos
o canto do galo
o miado dos gatos
o latido dos cuscos
o mugido das vacas
as portas batendo
a faina diária
o noticiários
as telenovelas
os xeretas
os chatos
os ingratos
as carrancas...
... que o riso volasse às caras tritonhas
e a gente que sonha pudesse gozar
uns lances dos sonhos
.. que a gente deixasse de ver no vizinho
defeitos mesquinhos
às vezes só nossos
tão nossos!
É...
Mas ainda não fosse essa a hora mais certa
de bulir-se rotinas
de vidas sem curvas
de escassas esquinas
de andar retilíneo
sem fio de navalha
sem adrenalina
sem nada por baixo
bem pouco por cima
e sem desafios...
Ele chegou cá de dentro
erupcionou cá do peito
em fúria indimável
selvagem
quebrando conceios
padrões
mil vezes mais forte
que o imã que ao Norte
atrai os metais...
mais, muito mais que todos ciclones
furacões, tornados maremotos
reunidos
Chegou
Instalou-se
Dono das coisas do meu coração
Desfiz sua bagagem
Havia cá em mim espaços vazios
Doídos
Onde justo cabiam
O estar e os trastes
Do amor anarilho
E assim se instalou
Assinar:
Postagens (Atom)